A esculhambação não-declarada revelada pelo 8 de janeiro e pela venda do Abaporu
Casos evidenciam descaso do estado sobre a ausência de uma política nacional de proteção a obras de importância histórica. Malha fina que grite.
A travessia da tela de Tarsila para o MALBA foi problemática. Sim, houve uma mobilização do poder público para manter a obra em São Paulo. José Serra cogitou a possibilidade de adquirir a obra para o Museu de Arte Moderna (MAM) ou para o acervo municipal. Mas consideraram o custo alto (à época, US$ 1,5 milhão). Somada a falta de agilidade que inviabilizou a compra pública. Eu não acredito muito nessa versão, não.
“O Abaporu é um patrimônio latino-americano. Se o Brasil não o valorizou como deveria, não significa que ele deva ser esquecido”. Eduardo Constantini, fundador do Malba.
O papel do Itamaraty e da Receita Federal
Houve um apelo informal do Itamaraty para que a obra permanecesse no Brasil, mas não havia instrumentos jurídicos eficazes para barrar a exportação legal de uma obra de arte que não estivesse tombada. Artistas, críticos e jornalistas (PARA VARIAR) criticaram duramente o Estado brasileiro por não ter se antecipado ao risco de perda.
O caso evidenciou a ausência de uma política nacional de proteção a obras de importância histórica.
Tentaram impedir a saída da obra do país através de um tombamento emergencial via IPHAN. No entanto, o Abaporu não era registrado como patrimônio nacional, e uma lei impediu que fosse.
Daí a pergunta
Se mesmo tombado, nosso patrimônio é esfaqueado, quebrado, roubado, caso do 8 de janeiro, tombar o Abaporu resolveria alguma coisa? Não sei. Só se dá valor quando perde. Segue uma lista pequena do que aconteceu após o episódio Abaporu.
E abaixo os Projetos de Lei sobre proteção de obras de arte tombadas ou não.
Nenhum andou. Vou tentar uma entrevista com o Caleiro para entender mais os motivos.
Esculhambação gritante
Pelo menos não está nos Estados Unidos. Por lá está A Lua.
O Abaporu é hoje daquelas obras que, de tão valiosas, não têm mais preço. Em 2011, a então presidente Dilma Rousseff perguntou ao argentino Costantini quanto custaria repatriar a obra. Ele falou em US$ 200 milhões e a conversa terminou ali.
Naquele ano, para uma exposição no Palácio do Planalto, o dono do Abaporu fez várias exigências para emprestá-lo. Além de um rigoroso controle de umidade e temperatura, o quadro fica protegido por um vidro e uma fita. A tela passou 24 horas encaixotada até se aclimatar por causa da diferença de temperatura de Brasília. Curiosidade: o Abaporu tem um segurança só para ele.
GOSTARIA DE DECLARAR MEU AMOR
E casos e mais casos de falsificações, vendas com certificados adulterados, empresários metidos a especialistas autenticando obras apenas para pegar sua % . Parentes, sempre os parentes também, fazendo merda. E os caras aí dando pinta de Indiana Jones.
O Brasil também é o país que mais comprou arte NO MUNDO em 2024. Por que será, hein? Não tem regra, não tem lei, mas tem valores subjetivos e gente querendo anistia. Esfaquear um Di ? Papuda, sempre.
E ao mesmo tempo vemos uma exposição da Tarsila quebrar o recorde do Masp. Ela está nos livros didáticos, meu bem.
A trajetória do Abaporu é NOVELA. Antes de sair do Brasil foi contada na maçante biografia de Tarsila do Amaral, escrita por Aracy do Amaral. No texto, a biógrafa afirma que a artista vendeu a tela para o Museu de Arte de São Paulo (Masp), fundado por Pietro Maria Bardi. Segundo Aracy, Tarsila tinha a esperança de ver o quadro por lá.
A versão de Pietro é outra: no mês de junho de 1984, Tarsila do Amaral teria vendido diretamente, em São Paulo, a tela pela quantia de Cr$ 300 milhões para o acervo pessoal dele. “Nunca se falou em acervo do Masp, pois o museu havia parado de fazer aquisições em 1953. Todo mundo sabe que o acervo do Mirante das Artes é meu. Aliás, as duas telas da Tarsila, Abapuru e Antropofagia, foram adquiridas e comercializadas mais tarde.”
Por falar em Pietro e MASP, o Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand revisita mais de sete décadas de sua trajetória na exposição Cinco ensaios sobre o MASP — Histórias do MASP, em cartaz de 28 de março a 3 de agosto. Em um momento de expansão, marcado pela inauguração do Edifício Pietro Maria Bardi, a mostra, realizada no sexto andar, reflete sobre a história do museu e sua importância para a constituição de um projeto de museu moderno.
Mas tem um problema maior
Desinformação. Para imensa maioria de nós, crimes envolvendo arte é coisa boba. Não é. Atualmente é um dos principais braços financeiros do crime organizado.
E este é o tema do meu próximo livro planejado para 2026.
Bjs